Partidos políticos da oposição angolana condenaram hoje o “escândalo financeiro” que envolve oficiais superiores ligados à Presidência da República, pedindo “responsabilização exemplar” dos implicados, enquanto o MPLA garante que “o combate à corrupção vai continuar, doa a quem doer”. Por alguma razão João Lourenço afirmou que viu roubar, participou nos roubos, beneficiou dos roubos mas que não é… ladrão.
“Estamos perante uma situação bastante grave, uma situação que vai afectar a reputação de Angola no ponto de vista económico e financeiro, porque não é admissível que avultadas somas financeiras fiquem fora do sistema financeiro”, afirmou hoje o presidente da CASA-CE, Manuel Fernandes, em declarações à Lusa, acrescentando que as avultadas somas monetárias encontradas em posse do major Pedro Lussaty revelam “uma certa máfia económica”.
“E descredibiliza (o país), de certa maneira, face a potenciais investidores, conferindo assim o estatuto de Angola de um país que não é sério, é grave”, sublinhou.
A Procuradoria-Geral da República (PGR) angolana anunciou na última semana a detenção do major Pedro Lussaty, ligado à Casa de Segurança do Presidente da República angolana, encontrado na posse de milhões de dólares, kwanzas e euros.
Pedro Lussaty era dono de 45 imóveis, dos quais uma penthouse em Talatona, cinco apartamentos em Lisboa, um apartamento na Namíbia, dois iates de luxo, tinha em seu poder 19 malas abarrotadas de dólares, euros e kwanzas, duas dezenas de relógios de luxo revestidos de diamantes e ouro rosa e 15 viaturas topo de gama.
Mais de 10 oficiais generais, incluindo o ministro de Estado e Chefe da Casa de Segurança do Presidente angolano, general Pedro Sebastião, foram exonerados por João Lourenço na sequência deste caso cujo processo continua sob investigação na PGR.
Manuel Fernandes aplaude as exonerações, mas pede responsabilização dos implicados, que classifica como “autênticos antipatriotas”, considerando estar-se diante de uma situação “periclitante, com agravante de ser um agente que está ligado ao epicentro do poder”.
Do ponto de vista da imagem de Angola, da mobilização de investimentos, realçou, “esta situação vem manchar o bom nome de Angola e concorre para inibir potenciais investimentos para Angola”.
“Não sei se as exonerações bastam como tal, as pessoas devem ser responsabilizadas, porque tudo indica que é uma rede e todos aqueles que estimulam esse tipo de exercício devem ser responsabilizados porque são autênticos antipatriotas”, defendeu.
O também deputado da CASA-CE lamentou ainda a actual “degradação social das famílias, o elevado nível de pobreza no país e a debilidade do sistema de saúde”, enquanto “há pessoas a brincarem com avultadas somas monetárias que dizem respeito a todos os angolanos”.
Já o presidente da FNLA, Lucas Ngonda, enaltece que esses factos sejam tornados públicos nesta fase, contrariamente ao consulado do ex-Presidente angolano José Eduardo dos Santos, considerando que João Lourenço “é um homem de muita coragem”.
“Porque tudo está a acontecer na sua própria casa, agora, na Presidência da República é onde se está a descobrir que um major que não tem um salário famoso aparece com milhões. Isso até é uma pouca-vergonha”, frisou.
Para o também deputado da FNLA, na oposição, essas práticas traduzem-se em “crimes que devem ser sancionados de uma forma exemplar”, referiu. “Sim, algumas pessoas foram exoneradas, mas o exonerar não é suficiente, é preciso que a justiça funcione de uma forma exemplar para que isto marque o período que estamos a viver e que as coisas não tornem a acontecer”, rematou.
O combate à corrupção, à impunidade e ao nepotismo constituem os principais eixos das promessas de governação do Presidente angolano, João Lourenço, há quase quatro anos no poder.
Em nota enviada hoje à Lusa, em resposta a um pedido para comentar sobre as incidências deste caso e as consequentes exonerações, o secretário para a Informação do Bureau Político do MPLA ex-governador de Benguela, Rui Falcão, referiu que o “combate à corrupção continua a todos os níveis”.
Segundo o político do MPLA (no poder desde 1975), “só é possível trazer a público estes e outros factos, porque o combate à corrupção é efectivo e sério”.
“Não fosse isso, jamais esses casos seriam conhecidos”, escreveu Rui Falcão, observando que “corrigir o que está mal não é uma vereda de facilidades”.
O deputado do MPLA referiu igualmente que, ao tomar as decisões que foram tomadas, o seu partido “sabia das consequências daí advenientes”, afirmando que “entre manter o `status quo` ou agir” o seu partido “vai continuar a agir até baixarem os índices de corrupção no país”.
“O que lhes posso garantir é que continuaremos firmes na construção de uma Angola melhor, doa a quem doer”, concluiu Rui Falcão.
Sobre o assunto, o Banco Nacional de Angola (BNA) confirmou que o dinheiro encontrado na posse de um oficial das Forças Armadas Angolanas, e que pertencia à Casa de Segurança do Presidente João Lourenço, saiu de um banco comercial, sem revelar a identidade do banco. Por outras palavras, o BNA revelou que o país é uma espécie de casa da mãe-joana onde vale (quase) tudo.
O escândalo multimilionário envolvendo valores em dólares e em euros voltou a abalar os angolanos (20 milhões dos quais passam fome às segundas, quartas e sextas, às terças, quintas e sábados nada têm para comer e ao domingo perguntam a Deus que mal Lhe fizeram), tendo como epicentro a Casa de Segurança da Presidência da República que integra a vasta lista de instituições do Estado que estão sob investigação de corrupção.
O envolvimento de altas patentes militares em casos de corrupção e em crimes de peculato (roubo) já era de domínio público, mas nunca foram admitidos pelo Ministério Público (desde sempre uma passiva sucursal do MPLA) que sempre alegou falta de provas para sustentar as várias denúncias. Aliás, mesmo agora a Procuradoria-Geral da República tem de ter todo o cuidado por que os ladrões generais podem alegar, citando João Lourenço, “que viram roubar, participaram no roubo, beneficiaram do roubo mas que não são… ladrões”.
Folha 8 com Lusa